Qualquer semelhança não é mera coincidência

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Queira você ou não, o bbb acaba sendo, tal qual uma novela, interpretada como uma representação da vida aqui fora. Mesmo que editada e com corpos brancos, magros e padrões. A novela é uma dimensão aumentada e muitas vezes caricaturada da “realidade”, uma ficção que muitas vezes perde em inverossimilhança comparada à vida real. E o bbb nada mais é que um conglomerado de imagens roteirizado e editado para transformar vidas e pessoas “reais” em novela e entretenimento, pagando de programa espontâneo e improvisado.
E, assim como na vida real, em que julgamos pessoas e construímos nossas imagens delas e de quem são através de coisas que vivemos com elas, que as ouvimos dizer, que nos contam que elas dizem, e de suas atitudes, é na arte da edição que o bbb constrói seus personagens.
A memória é uma ilha de edição, já dizia Waly Salomão.
E vendo uma cena nesta madrugada, me lembrei de cenas que já aconteceram na minha vida. Cenas que eu vivi porque achava que era eu quem dirigia a minha vida. Mas não, na maioria das vezes tem um roteiro maior do que nós e mais seguido à risca, que são os famosos TCHARAM: PADRÕES DA SOCIEDADE.
Daí ontem tinha uma mulher negra chorando por um homem branco no meio de uma festa do bbb. Cara, eu num aguento mais ver mulher chorando por homem… e eu sei como é, porque eu já chorei muito, mas muito mesmo. Pensa em alguém que quase foi destruída por homem. Muito prazer, meu nome é Lídia Orphão, e eu tenho pós-doutorado em rejeição.
Qual era o contexto desse choro? Uma mulher negra toda maravilhosa e confiante, que conhece um homem branco que a trata como uma amiga querida, vai se aproximando cada vez mais dela, fica íntimo, com ela ele fala sobre tudo, ele percebe o interesse dela e desconversa dizendo não estar preparado para uma relação ainda, e ela, muito compreensiva, entende, e o mantém como grande amigo. Até que chega a noite e ele beija outra na festa. E quem é que ele beija? A bonitinha, branquinha, magrinha, legalzinha, popular com cara de mocinha da novela. Muito parecido com o que eu e um monte de mulheres gordas já vivemos. No fim das contas, as solidões são mesmo muito parecidas.
E eu já me deparei muitas e muitas vezes com esse tipo de homem e situação na vida: esse amigo que te cozinha e te mantém por perto para inflar o ego dele, pra mostrar como homens e mulheres podem ser amigos, embora ele saiba desde o início que você estava interessada nele, e fique sempre saindo pela tangente. Ele gosta de se sentir desejado, e se abre com você, vira o melhor amigo, um querido, ele te conta tudo, vocês falam de tudo, ele diz que há coisas que ele só consegue falar com você. Ele faz você se sentir tão especial e querida, e você não está acostuma a isso. Sempre que vocês estão juntos ele dá um jeito de encostar em você, mas é coisa de amigo, ele gosta de toque, às vezes ele vai até te pegar de vez em quando, mas que isso! É coisa de amigo. Ele não quer nada sério, não está preparado para uma relação agora. Ele ganha sua confiança e vira um raro cara legal, entre tantos outros tão escrotos com quem você esteve.
E você ali, marinando no tempero, sem ser comida, esperando só o mínimo de sinceridade e confiança daquele homem. Você já passou tanta coisa, não é possível, é ele! Finalmente um cara legal na minha vida.
E no dia seguinte ele aparece namorando a mocinha da novela.
Mesmo depois de ele ter te comido na amizade ontem à noite. (Mas só depois de todo mundo ter ido embora e de ele estar bêbado). Porque eles gostam de mulher moderna e fora do padrão só até a página dois, diz que é bom pra ser amante até. Pra namorar e apresentar pra família eles querem padrão mesmo.
RISOS CHOROS
E a gente chora esse choro porque se sente enganada, porque foi sincera desde o início, porque se entregou, se abriu e confiou no cara que disse que era diferente de todos os outros, que ouviu todos os seus relatos de homens escrotos que nos destroem e no final acabou te tratando do mesmo jeito.
E eu, como mulher gorda, também entendo esse choro.
Mas eu percebi com o tempo que chorar não mudava nada, que sentir pena de mim e da minha rejeição não me fortalecia e que esses homens também jamais mudariam.
Então eu venho mudando. Se não vai me comer, eu não vou temperar.
Aí quando a gente fala em se amar, a galera acha que a gente tá exagerando. Não é que a gente tenha que se amar e se fechar, mas é porque se amando a gente fica mais forte e, com o tempo, transfere a pena pro outro. E fica mais fácil prever e identificar essas situações. Pode ser até que a gente chore, mas a gente sem dúvida se recupera mais rápido.
Sabe, não sou eu que sou uma coitada rejeitada. Eu fui a melhor que pude, eu fui exatamente quem sou, fui sincera, verdadeira e aberta. Eu tenho é pena de quem não me aproveita. São eles que perdem, é isso que a gente precisa entender.
Aí vem os homi querer fazer mimimi com friendzone AH MERMÃO, NUM FODE
Mas isso fica pra outro texto …

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