Monogâmico: amando errado desde criancinha

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Affe, mais um vídeo de internet em página de humor que me deixou triste e as pessoas tão tudo dando risada. Sei que é de uma sutileza tamanha enxergar uma questão por baixo do riso, mas olha, francamente, vocês riem de umas coisas muito erradas, na moral! Mas sim, muito também porque nos ensinam muitas coisas erradas como verdades absolutas a serem seguidas.

Mas vamos ao vídeo:
O vídeo mostra duas crianças com seus pais num shopping, dentro de uma loja fazendo compras, quando o pai se afasta e as crianças perambulam pela loja. Logo, uma das crianças vem correndo contar pra mãe que o pai está conversando com uma mulher, num tom de queixa, ao que a mãe ri e responde: “Ah é? Tá conversando é?” Como se a criança tivesse acertado em sua queixa, em “entregar” o pai, que “errava” em conversar com outra mulher, logo ele, sendo casado. Num relacionamento obviamente monogâmico, movido por suas expectativas e ilusões. RISOS CHOROS As crianças não devem ter nem cinco anos de idade, cara. Eu achei isso mó triste, elas terem esse entendimento de relacionamento tão errado e desde tão cedo.


Mas se eu começar a falar da heteronormatividade compulsória e suas brincadeirinhas, que começam desde a forçação de barra dos namoradinhos na creche, cês vão achar que eu tô exagerando ou usando palavras muito difíceis.
Cês entendem o quão fudido é isso? O quão esse ciclo de concepções erradas sobre o amor e sobre relacionamentos se reflete na maneira como nos amamos, escolhemos e aprendemos a amar e como nos relacionamos ao longo de toda a nossa vida? Cês vão dizer que é coisa da minha cabeça, mas me diz, você preferiria ter sido criado num lar em que os seus pais fingem ser felizes e se mantém casados mesmo infelizes – quando muitas das vezes essa infelicidade subentende “traições” dentro desse relacionamento monogâmico, em grande parte sempre partindo de homens cis hetero – culminando em divórcio e ou alienação parental, disputa de guarda e desrespeito, quando não terminam em feminicídio (!), ou com seus pais livres em um relacionamento aberto em que, conforme o acordo que resolverem fazer, podem sair livremente com quem querem, quando possível, sem fingimento nenhum, mas que ao menos te ensinasse outros valores além da posse do corpo e do desejo do outro como amor? Olha, eu preferia a segunda opção, viu?


A monogamia tem essa faceta de deturpar o que é amor e o que é relacionamento, e eu tô falando porque também fui criada assim e vivi nessa atmosfera por muito tempo. Nessas concepções errôneas, equivocadas e por vezes, violenta, de que amar é possuir desde o corpo ao desejo do outro. Esse equívoco que faz com que a gente acredite que dentro de um relacionamento a gente pode exigir, cobrar, esperar que o outro nos ame da maneira que a gente quiser. Que tudo é prova de amor. E que amor dói, é sofrido, complicado, pesado.


Eu acho que a gente precisa começar a repensar essas coisas, essas formas que temos de nos relacionar, porque o que não falta por aí é relacionamento fud1do, com pessoas adoecidas, agredidas ou mortas o tempo inteiro, ouvindo (quando sobrevivem) que “foi tudo por amor”.
Amor não é só bom se doer. Amor não dói, o que dói é o que a gente espera dele. O que a gente impõe que o amor seja: esse amor romântico que nunca foi sobre nos completar, e sim sobre nos controlar. Amor não é controle, não esqueça: amor livre é pleonasmo. E ele começa de dentro pra fora, ao contrário de tudo que nos ensinaram, no próprio. Como é que a gente vai amar alguém sem se amar primeiro, né? Segura essa marimba.

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