Manda pauta, mas pensa um pouco antes

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Muitos de vocês nos mandam sugestões de pautas ou mandam pautas dizendo que gostariam de ouvir o que temos a dizer sobre determinado tema. E isso é muito bom. Porque faz a gente sentir que estamos nos caminho, que estamos sendo ouvidos. Mas, às vezes, também nos chega umas coisas que a gente olha e fala: sério?

Ontem foi um dia desses. Uma pessoa mandou mensagem no meu instagram pessoal dizendo que tinha uma sugestão de reportagem sobre os ucranianos, que gostaria de falar comigo. Perguntei qual a melhor plataforma pra conversarmos; ela sugeriu whatsapp e passou o número.

Chamei.

E ela disparou essa: “Alguns Ucranianos estão com medo do status de refugiados. Achava estranho, mas depois percebi a questão: Estão fazendo analogia com a questão dos refugiados sírios e campos. E outros estão vendo fake news de que vão trabalhar para o Governo”.

Eu pensei 30 segundos e respondi: “Ok. Mas gostava de entender como você vê, especificamente, diferenças entre os refugiados ucranianos e os sírios, uma vez que ambos são refugiados de guerras?”

Ela nunca respondeu. E isso foi há quase 24 horas. E ela tem estado sempre online.

Fui ver melhor o perfil da pessoa.

Brasileira, branca, advogada. Vivendo em Portugal. Casada com um branco, mãe de duas crianças brancas. O perfil dela no instagram (que é fechado), traz como descrição de perfil: advogada com clientes em 5 continentes, mãe, esposa, empresária, estudando doutorado.

Eu não sei como ela chegou até mim. Eu não sei se foi um teste, se foi um blefe, se foi uma piada, se foi um “vai que cola”. Eu não sei se ela já me leu algum dia na vida.

O que eu sei é que: se tem coisa pior que europeu que se vê como superior por ser branco, é brasileiro que se acha branco. Se acha branco no Brasil e quer vender uma imagem de branco quando sai do país. No fundo, todos sabem: vêm viver na Europa e descobrem não são brancos porcaria nenhuma. Nasceu BR, vai morrer BR. Se passar despercebida, basta abrir a boca, ter sotaque, soltar uma expressão brasileira, mostrar o passaporte…

Ou seja, a branca veio me dar uma pauta que é: refugiados ucranianos são diferentes de refugiados de países da África ou do Oriente Médio, mesmo que todos eles estejam fugindo de guerras. Esse é a pauta.

ESSA É A PAUTA?

E, por diferentes, neste caso, me parece algo como: superiores, melhores, não querem ser confundidos com os outros. E veja, não foi um europeu que me disse isso; foi uma brasileira.

Logo pra mim, que tô apanhando há 10 dias por falar sobre o racismo na guerra e fora dela, sobre o preconceito e a seletividade com os refugiados? Poxa. Atirou e errrrrrroou.

Eu sinto muito pelas pessoas que estão fugindo da guerra. Mas não venha me meter essa superioridade, que aqui não vai funcionar, querida.

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