Fogo nos racistas: o imaginário de justiça

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Reprodução Alma Preta

Há quatro anos, Gustavo Pereira, mais conhecido como Djonga, lançava a música “Olho de Tigre”. Talvez você não se lembre do nome da canção, mas tenho certeza que já ouviu a famosa frase: fogo nos racistas. Essa frase ganhou grande repercussão por causa da música e, desde então, vem sendo bastante utilizada em eventos e nas redes sociais.

Em junho de 2020, uma enfermeira utilizou suas redes sociais para denunciar um caso de racismo que sua irmã havia passado e usou justamente a frase mencionada. A postagem teve um grande alcance na internet e também em programas de televisão.

A partir disso, a dona da loja entrou com um pedido de dano moral solicitando uma indenização no valor de R$13,8 mil com a justificativa de “recuperação de sua imagem e honra”.

O juiz Schmitt Corrêa, da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, além de determinar que a enfermeira apagasse a postagem em suas redes sociais, determinou que o valor da indenização fosse de R$ 5 mil, pois considerou elevado o valor solicitado pela autora (a dona da loja).

Segundo a enfermeira, sua irmã havia sofrido um problema capilar e, em decorrência disso, estava careca. Sendo assim, decidiu ir até uma loja e comprar um adorno que custava R$100. No entanto, ao chegar à casa, reparou que o produto custava R$70. Ela retornou à loja para realizar a troca, mas a dona do estabelecimento se recusou a fazer a substituição do produto.

Além da recusa em trocar o produto, a dona da loja ofendeu a cliente e a agrediu com um ferro de acordo com o relato da enfermeira. Este caso aconteceu em setembro de 2019, no centro de Mogi Guaçu, cidade a 172km de distância da capital paulista.

O caso foi registrado na delegacia e foi iniciado um inquérito, porém foi arquivado meses depois sem nenhum desdobramento judicial. No dia da agressão, a dona da loja foi liberada. A postagem, realizada tempos depois pela enfermeira, era um pedido de socorro, foi a forma encontrada para solicitar ajuda, fazer um apelo para que a justiça fosse feita.

No entanto, o post teve o efeito contrário do que o esperado, uma vez que o juiz alega que a frase “fogo nos racistas” gerou uma situação de ameaça para a dona da loja. Enquanto isso, o inquérito em que consta o constrangimento, a agressão física e verbal que a irmã da enfermeira sofreu foi arquivado.

A nossa justiça segue entregando tudo, mas não é para todos. Como exigir justiça dessa forma? Para quem devemos exigir justiça se ela tem uma cor e classe que não é a nossa?

A enfermeira só queria justiça para a sua irmã, no entanto, ao invés disso, foi acusada de incitar a prática de crime e condenada a pagar as custas processuais e honorários dos advogados, que corresponde a 15% do valor da condenação.

Enquanto isso, um torcedor do Boca Juniors, que havia sido detido após praticar atos racistas para a torcida do Corinthians, pagou R$ 3 mil de fiança e saiu impune do país fazendo selfie com emoji de macaco. Essa é a nossa justiça.

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