Afeto também é resistência

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Afetos homens negros

Ao participar de uma entrevista em que se debatia sobre projetos políticos, uma frase me chamou atenção: eu te amo. Essa frase foi dita de um homem preto para outro. E por que isso me chamou atenção? A resposta é simples: pelo fato disso não ocorrer com frequência.

A troca de afeto entre homens, principalmente homens negros, não é comum. O ato de dizer “eu te amo” não é comum quando estamos nos referindo aos homens negros. Qualquer coisa que se remete à afetividade, é visto como algo negativo, algo que deve ser evitado.  

A afetividade é deixada para as mulheres: elas é que devem ser carinhosas e afetivas por serem consideradas seres frágeis que precisam de cuidados. Mas não são todas as mulheres que são vistas dessa forma e acredito que você saiba a cor dessa mulher que deve ser cuidada e amada.

O afeto entre homens pretos, e aqui não estou me referindo a um relacionamento amoroso, não é algo visto com bons olhos. Dizer “eu te amo” não é coisa de homem, é “coisa de viado”. E esse pensamento contribui muito para a homofobia, além de determinar que o único relacionamento possível e aceitável é o heterossexual.

O que é coisa de homem? Como um homem negro deve agir? Muitos são os estereótipos sobre o homem negro, como, por exemplo, ser agressivo, ser forte, ter pênis grande, entre outros. Mas nenhum deles menciona que o homem negro também chora, possui fragilidades e diz “eu te amo”.

“Homem não chora”. Será? Os Racionais já disseram: Jesus chorou. No entanto, a imagem de Jesus é branca. Um cara de cabelos longos, de pele clara, olhos azuis. Homens negros não se enquadram nessa imagem. Há um ideal de homem e esse ideal não inclui homens negros.

Nas mídias, raramente um homem negro é apresentado como aquele capaz dar e receber afeto. Ainda hoje vemos uma desumanização da figura do homem negro muito grande, por isso essa frase me chamou tanta atenção durante a entrevista.

O racismo faz com que naturalizemos diversas coisas. É “normal” que homens pretos sejam representados de forma viril, preguiçosa, agressiva, mas não é normal que digam “eu te amo” para um amigo e isso não se restringe às mídias.

Homens pretos são afetados desde sua infância por um ideal de masculinidade. Ideal esse que não os contempla, os afeta de tal forma que faz com que o ideal de construções afetivas seja pautado no distanciamento, nas relações brutas.

Em um sistema que é organizado para colocar pessoas pretas umas contra as outras, devemos debater sobre o afeto. Afinal, amor preto é resistência. Não me refiro apenas ao amor entre casal, mas entre amigos, entre os seus, entre os nossos. 

Como diz Djonga: peguemos de volta o que nos foi tirado.        

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