A xenofobia chegou no meu filho

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Eu venho escrevendo sempre aqui sobre xenofobia e preconceito. Escrevi muito sobre o problema da xenofobia nas escolas portuguesas (além de outros problemas). E me lembro de comentar sobre esses casos em casa e meu filho dizer: “sempre dizem que tive sorte, porque nunca tive problemas nas minhas turmas ou com os meus professores”. Isso mudou ontem.

Meu filho é um garoto super tranquilo, na dele, tem boas amizades em Portugal e quase todos os amigos dele aqui em Portugal, são portugueses. Os pais dos amigos gostam muito dele. Ele frequenta a casa de alguns dos meninos, saem juntos, vão em viagem juntos nas próximas férias… Ele está no último ano escolar. Estamos aqui há três anos.

Mas acontece que ontem, o centro de saúde resolveu ligar no celular do meu filho durante a aula. O celular estava no silencioso. Ele recusou a chamada três vezes. Insistiram. Ele desconhecia o número, mas ficou preocupado e pediu licença ao professor para atender. O professor recusou. Disse que não podia atender no meio da aula. Ele insistiu que já havia recusado chamadas do mesmo número por três vezes, que poderia ser importante. E eis a resposta: aqui não é como na tua terra.

A urgência do centro de saúde era: pedir pro meu filho levar a carteira de vacinação dele para atualizar as vacinas no sistema. Muito importante pra insistir quatro vezes numa chamada. E isso é um ponto.

O outro é: AQUI NÃO É COMO NA TUA TERRA?!

Meu sangue ferveu num nível. Por mim, tinha ido na escola, escrito email, reclamação, exposto o nome, o endereço, a quinta geração desse xenofóbico desgraçado. PORÉM, CONTUDO, ENTRETANTO, meu filho disse: “Mãe, por favor, não faz nada. Esse professor é assim. Já fez isso com outros brasileiros. E ele vai me foder se arrumarmos dor de cabeça pra ele. É meu último ano, e é a minha principal específica. Não posso reprovar. Ele já não me ajuda em nada, não me esclarece dúvidas. Eu estou a estudar todo dia e ainda assim sei que vai correr mal. Se a gente reclamar dele, eu vou ficar refém”.

Faz ideia do que é não poder fazer nada? NADA. Eu, infelizmente, não posso expor ninguém aqui. Também não posso esfregar a cara dele no asfalto enquanto digo que não, aqui não é a minha terra mesmo, porque na minha terra ninguém ligaria no telefone de um menor de idade pra lhe mandar fazer algo. E porque na minha terra, um professor que faça o que ele faz, é punido.

Então esse texto todo é só um desabado. Porque eu precisava dizer que aqui, imigrante nenhum está imune. E, convenhamos, imigrante nenhum está imune em lugar nenhum do mundo. No Brasil, imigrante tratado bem é europeu e americano. Latinos, não. Africanos, não. Asiáticos, depende. Mas nesse momento, eu só posso reclamar daqui. De ver pessoas sendo feridas por pessoas que se sentem superiores por conta do lugar onde nasceram.

Volta pa tua terra OU Aqui não é tua terra são frases que não me ferem. Mas quando é com o meu filho, me entristece a alma.

E digo mais: eu gosto de Portugal. Eu tenho amigos portugueses. Eu tenho família (do meu companheiro) portuguesa. E não vou voltar pa minha terra por conta de um bando de preconceituoso. Mas que dá ódio no coração, dá.

Ps.: a foto que acompanha esse artigo não é da escola do meu filho. É de um caso que aconteceu em Portugal em 2020, onde o muro de uma escola foi pixado conforme você pode ver na imagem.

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