Não existe interpretação de texto em SP (e na internet toda)

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Ilustração: Claudio Brites

Não é de hoje que esse assunto tá presente aqui na CT: o papo de não haver amor e interpretação de texto na internet. Grande parte das ofensas e críticas sofridas, principalmente ÀS colunistas, vêm de pessoas, em sua maioria homens, que nem vão até o site ler o texto todo. O “esse texto é uma merda” muitas vezes se pauta na chamada, no título ou num trecho destacado.

Mas não é assim, não é? Precisamos ler um texto inteiro para compreender suas nuances, se contém ou não sarcasmo, ironia, se o jogo de tese e antítese se mantém durante toda a discussão. Tanto para discordar quanto para concordar, não tem jeito, precisa saber da ideia como um todo, do contexto.

Estamos em época de eleições e isso é ainda mais importante. Grande parte das estratégias de campanha das fake news, se embasa exatamente nessa falta de leitura e interpretação, somadas ao desejo enorme de opinar, deixar sua marca, sua ofensa quentinha do café da manhã. Porque, olha, a gente não sabe só ignorar algo com o qual não concordamos, precisamos fazer textão, ofender a mãe de quem escreve; queremos humilhar mesmo.

E isso é o fascismo. A morte de tudo fora da “irmandade”, a morte da alteridade. Aos fascistas, não há texto fora do que se espera enquanto verdade. Não se interpreta, busca-se o significado desejado ou se converte o discurso a favor desse significado. Por isso o fascismo se opera para todos os lados políticos, porque de todos os lados temos os desejosos de destruir a alteridade. Racistas, machistas, xenófobos, psicofóbicos, lgbtqia+fóbicos, transfóbicos, todos esses almejam a destruição das subjetividades não reconhecidas por eles, ou seja, há no cerne de cada uma dessas estruturas o desejo de estar ou ao lado do “irmão” ou ao lado do corpo, do cadáver, daquele que se odeia. No fundo, há um verme fascistóide tentando nos corroer diariamente.

Em um texto anterior, usei de ironia para criticar a postura absurda e indefensável das forças armadas e suas picanhas, viagras etc. e, também, o meu desacordo com críticos que usam o machismo como arma, sabendo que isso os atinge. Pra mim, não é boa desculpa o machismo de quinta série ser usado para qualquer tipo de efeito; sinto que perdemos mais com isso do que ganhamos.

O mesmo ocorre quando não paramos para ter uma postura leitora, atenta, na busca por saber do que se está falando e reconhecer nas ideias com as quais não concordamos ou que nos despertam algum tipo de sentimento novas possibilidades de raciocínio, interpretação de mundo ou de amar. Sim, porque no fundo, tudo é sobre como amar. O fascista não ama, pois o amor exige alteridade, interpretação, leitura; o fascista projeta, no outro, no mundo, sua própria imagem e semelhança, acopla-o no seu feixe, e destrói com seu machado tudo onde isso não funciona.

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