Everybody hates piada com doença

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Eu dormi, só tinha uma pandemia e uma guerra de brancos, no Leste Europeu.
Eu acordei, e o Príncipe de Bell-Air tinha deitado o Carinha Que Mora Logo Ali de BedStuy na porrada. 

No Lollapalooza, ou melhor, Festival Out Bolsonaro, foi um arregaço. Djonga e Vittar fazendo os jornalistas falarem palavrão que o RH vai ter que chamar todo mundo hoje cedo. Bolsonaro reclamando, e os sertanejo tudo se corroendo de inveja por não ser convidado pra um festival foda, porque, vamo combinar, né?

Safoda eles. E elas. 

Anitta respondendo ao ministro do TSE, dizendo que a multa tava barata. Um esculacho pontual e necessário. A política brasileira virou meu novo entretenimento, com a presença de grandes artistas.

Eu vou te dizer. Não me preocupa quando brancos saem na porrada, pelo contrário. Acho até um momento de lazer e diversão com a família. Sentar as crianças no sofá, e ver brancos atirando uns contra os outros, acusando-se mutuamente, sem ouvir um dizer pro outro: “branco!”, porque né. É a briga in natura. Aprendo até outros xingamentos. 

É ÓBVIO que vão surgir os universitários e os pensadores éticos tomando lado, uns dizendo que isso foi apenas mais um dia na vida de Chris, que todo mundo odeia, e outros dizendo que é lamentável. 

As feministas, sobretudo as brancas, vão parar de defender a Ucrânia por um dia pra linchar Smith, dizendo que “não precisamos de macho pra nos defender”, o que, convenhamos, no morro, a maior parte senão a totalidade das mulheres negras, discorda.

É. É um ponto delicado. Ia ser mais interessante ver a Jada, esposa que foi ridicularizada pela piada, levantar e lavar o Chris na peia, ou falar duas ou três frases, na classe, que poderiam destruir o emocional do cara.

Mas aí, é nosso desejo de ver arena e gladiadores falando.

Chris levou uma chinelada na boca, porque criticou a ausência de cabelo de Jada Smith. Ela riu, mas na sequência, ficou abatida. Will sacou, levantou, e atualizou com sucesso o limite da comédia. 

Não é sobre estética. Jada está sob um tratamento, de Alopecia, que faz com que os fios de cabelo caiam e parem de crescer. Ela, publicamente, decidiu assumir a doença. Observe:  Jada é atriz. Vive também da imagem. E todos nós sabemos como a imagem da mulher é cruelmente explorada pela mídia.

Não é o mesmo caso, mas a relação do ator ou atriz com o corpo é carregada de peso, porque o MATERIAL DE TRABALHO do ator é, também, o corpo. Alain Delon, ícone de gerações, por não suportar a velhice, decidiu se suicidar. O suicídio assistido é permitido na Suíça, onde ele mora, e ele disse que envelhecer é uma merda.

Ou seja, aceitar a imagem, o tempo, se já é difícil pra nós, mortais, pra essas pessoas públicas, é muito mais complexo.

Smith poderia meter um processo, e estaria enchendo o bolso.

Mas assim…nem tudo vai acabar de forma ética, como você gostaria que acabasse. Ambos são o suco de subúrbio, de Zona Norte. A Zona Norte é um estado de espírito, e embora não justifique, é a realidade, jovem. Precisa mudar? Precisa.

Mas é a real. 

Stand up que sacaneia alguém que você ama, e tá ali do teu lado, você, se é burguês, PENSA em bater na pessoa. Se é da Norte, levanta e mete o pau.

É. Lamentável. Mas também, né, bicho. O cara foi falar da mulher que tá doente. Porra. Smith, certo não tá. Mas errado, também não tá.

A gente tem é que levar o Will Smith pra alguns stand ups no Brasil. Convidar ele pra assistir o Danilo Gentilli. Alguns comédia brasileiros que acha que pode falar de tudo. Standup em Madureira termina com porrada. Começa piada, termina UFC. Dois espetáculos por um ingresso. Dependendo do comediante, acho que o pau é merecido. Monark? 

Eita, porra. Monark num standup pra um teatro cheio de judeus adeptos do Krav Magá. E alguns deles, advogados. TAVA FUDIDO.

Um poder só respeita outro poder, né. E são humanos, antes de serem negros. E humanos são complexos. Eles tem dinheiro, poder, Smith ganhou um Oscar, é aquilo. Chris tem dinheiro pra caralho, e não tem moral pra falar da mulher, porque separou, e nessa condição, tem que manter o respeito e o silêncio.

Mas principalmente, queridos: não se expor pros brancos que, no fim das contas, tão se deliciando com isso tudo. Dizendo que preto no Oscar dá nisso. No fim, eram dois homens negros, se odiando. E isso é onde perdemos.

Sei que queremos ver os nossos vencendo. Djonga derrubando tudo no Lolla, Anitta, primeira latina explodindo a porra toda, mas quando vencemos, precisamos ter o dobro de cuidado. Bater, sempre nos outros. Nunca nos nossos. Ético, lindo. Mas não abusa. Porque, gente. Caralho, a mulher tá em tratamento. A gente manda a ética pro caralho, sangue esquenta e desce a madeira.

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